A anulação da condenação do Eduardo Cunha pelo STF, a Operação Lava Jato e o conflito de competência

_Eduardo Maurício* e __Raphael Parseghian Pasqual**__ _

Decisão recente da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), com
placar final de 3 votos (maioria) x 2 votos (minoria), anulou a
condenação do ex-deputado Eduardo Cunha, pela prática dos crimes de
corrupção e lavagem de dinheiro no âmbito da Operação Lava Jato,
especificamente por pagamentos de propinas por navios sonda da Petrobras
para sua campanha eleitoral da época. Eduardo Cunha, ex-presidente da
Câmara dos Deputados foi condenado a 15 anos e 11 meses de prisão e ao
pagamento de uma multa indenizatória no valor de R$ 1,5 milhão, que
também foi anulada.

Eduardo Cunha foi preso em 2016 por ordem decretada pelo ex-juiz Sérgio
Moro (prisão que perdurou por mais de 3 anos), diante da sua alta
influência política e outras questões que configuravam risco à
referida operação policial federal.

Resumidamente, a anulação da condenação de Eduardo Cunha se deu por
conflito de competência, tendo em vista não ser a Justiça Federal
competente para ter julgado o caso, e sim a Justiça Eleitoral. E os
votos dos ministros Gilmar Mendes, Nuno Marques e André Mendonça, que
formaram a maioria, foram baseados nessa esteira, já que o plenário do
Supremo Tribunal Federal em 2019 decidiu que cabia a Justiça Eleitoral
processar e julgar crimes eleitorais relacionados a outros crimes, como
no caso em concreto, crimes de lavagem de dinheiro e corrupção.

Já o ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava jato, e o
ministro Ricardo Lewandowski votaram para rejeição de agravo
regimental interposto pelos advogados de Eduardo Cunha, que pleiteava
como base a incompetência da Justiça Federal para processar e julgar a
Acão penal que tramitou em seu detrimento, após a deflagração da
operação e por afronta às decisões prolatadas no âmbito da questão
de ordem no INQ. 3994 e no IN1. 4435

De forma técnica jurídica, os ministros Fachin e Lewandowski
entenderam que a Reclamação Constitucional apresentada pelos advogados
de Eduardo Cunha, com escopo de sucedâneo recursal, não tinha
cabimento face ao caso em concreto, eis que o ato reclamado apontado
como paradigma é desprovido de efeito vinculante geral ou
individualizado, cuja decisão vincula as respectivas partes
processuais. Ou seja, não entendeu como preenchidos os requisitos
legais, quais sejam: preservar a competência do Tribunal e para
garantia da autoridade de suas decisões (art. 102, I, ” l “, CF), bem
como contra atos que contrariem ou indevidamente apliquem súmula
vinculante (art. 103-A, § 3o, da CF).

Portanto, os dois votos da minoria não reconheceram o declínio de
competência à Justiça Eleitoral, pois não seria cabível o manejo da
reclamação constitucional para se obter reexame de conjunto fático
probatório dos autos.

Importante mencionar que existe também a esteira jurisprudencial de
diversas decisões judiciais que reconheceram nulidades processuais por
conflito de competência, que declaram a incompetência da Justiça
Federal do Paraná para analisar casos da Operação Lava Jato que não
são conexos com desvios e outros crimes na Petrobras.

Devemos nos atentar à figura da _lawfare_, que ocorreu contra o atual
presidente Luís Inácio Lula da Silva (Lula). Ou seja, a tática de
utilização com o uso estratégico do direito para aniquilar um inimigo
ou adversário processualmente, a famosa guerra jurídica, busca-se a
_”morte”_ jurídica da oposição política que esteja no poder, e neste
cenário cria-se uma narrativa arquitetada amparada de forma manipulada
na legislação aplicada ao caso em concreto, ou aproveita-se de lacunas
na Lei.

A perseguição jurídica, o _fishing expedition_ (pesca probatória), a
investigação policial viciada baseada em suposições infundadas e
manipuladas sem indícios de autoria e materialidade delitiva, a
acusação cega e insaciável com o desejo de punir, o processo penal
parcial e ilegal por parte do Ministério Público e do Judiciário, o
julgamento por Tribunal incompetente (conflito de competência), todos
casos de afronta à Lei, devem culminar em nulidades e anulação de
processos, como foi o caso de diversos casos que ocorreram na Operação
Lava Jato. Assim, devem ser respeitado os três pilares do direito
penal: o devido processo legal; o contraditório e a ampla defesa e,
sobretudo, o sistema penal acusatório (destinar os poderes de acusar,
defender e julgar a três órgãos distintos de forma imparcial e não
abusiva) e não o sistema penal inquisitório (reúne na mesma pessoa as
3 funções citadas, tornando o réu mero objeto da persecução penal).

Para finalizar, é importante analisar o reflexo dessa anulação,
sobretudo à teoria do fruto da árvore envenenada, ou seja, todas as
provas de fato, documentais e de direito coligidas na instrução
processual do ex-presidente da Câmara dos Deputados, podem ser arguidas
pela defesa de Eduardo Cunha, como provas inválidas (inaplicáveis),
nulas e que devem ser desentranhadas do processo a ser remetido para a
Justiça Eleitoral (autoridade competente para instaurar nova
instrução criminal não viciada). Isso porque toda a instrução
criminal foi conduzida por autoridades do Ministério Público e do
Judiciário incompetentes, que não detinham o poder para acusar e
julgar, fato este que abala a acão penal que condenou Eduardo Cunha, em
efeito dominó.

Portanto, a sociedade não deve nutrir um sentimento de injustiça ou
impunidade e, sim, de justiça, pois o aspecto técnico legal (o
verdadeiro direito) deve ser preservado em respeito à dignidade da
Justiça. Não pode o cidadão ser prejudicado por erro na aplicação
da lei penal. Mesmo que existam indícios da prática de crimes, a
formalidade técnica legal deve ser preservada.

_*Eduardo Maurício é advogado no Brasil, Portugal e Hungria,
presidente da Comissão Estadual de Direito Penal Internacional da
Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (Abracrim), membro
da Associação Internacional de Direito Penal de Portugal (AIDP –
Portugal )  e da Associação Internacional de Direito Penal AIDP –
Paris, pós-graduado pela PUC-RS em Direito Penal e Criminologia,
pós-graduado em Direito Penal  Econômico Europeu, em Direito das
Contraordenações e Especialização em Direito Penal e Compliance,
todos pela Universidade de Coimbra/Portugal, pós-graduado pela CBF
(Confederação Brasileira de Futebol) Academy Brasil –  em formação
para intermediários de futebol, pós-graduando pela EBRADI em Direito
Penal e Processo Penal, pós-graduado pela Católica – Faculdade de
Direito – Escola de Lisboa em Ciências Jurídicas e mestrando em
Direito – Ciências |Jurídico Criminais, pela Universidade de
Coimbra/Portugal _

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_*__ *Raphael Parseghian Pasqual é__ advogado especialista em Direito
Penal e Criminologia, Direito Empresarial e Direito do Consumidor, e
atuante em outras áreas do direito (Full service), pós-graduado em
Direito Penal e Criminologia (PUC-RS), pós-graduando em Direito Penal
Econômico  __pela Universidade de Coimbra/Portugal__ , membro da
comissão de Direito Penal e Processo Penal da OAB/SP – Santana e
diretor  de relações da Comissão de Direito Penal Internacional
ABRACRIM. _