Frio mais intenso em quatro anos: como as baixas temperaturas impactam a produção agrícola na região

Com geadas e frio intenso, cultivos exigem manejo estratégico; pesquisadora do Cepagri explica riscos e impactos no campo
O inverno de 2025 se estabelece com força na região de Campinas. De acordo com o Cepagri (Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura), vinculado à Unicamp, os termômetros chegaram a marcar 4 °C no final de junho — o registro mais frio desde 2021. O impacto direto foi sentido por agricultores da região, que precisaram lidar com geadas, perdas e a adaptação de cultivos às temperaturas mais amenas.
A onda de frio também levou a Defesa Civil do Estado a emitir alertas, orientando a população sobre os cuidados com a saúde e segurança. Embora seja esperado que o inverno traga temperaturas mais baixas e estiagem, o rigor do frio recente reacendeu preocupações no campo e acendeu discussões sobre os efeitos do clima na produção rural.
Impacto nas lavouras e risco de geada
Segundo a pesquisadora Ana Maria Heuminski de Ávila, diretora associada do Cepagri e especialista em agrometeorologia, o maior risco para as culturas durante o inverno é a ocorrência de geadas, especialmente quando as temperaturas se aproximam ou ficam abaixo de 0 °C. “As plantas têm resistência diferente às baixas temperaturas. Hortaliças e frutíferas, por exemplo, são extremamente sensíveis. O café também pode sofrer muito. Quando o frio é mais intenso, mesmo espécies adaptadas à região sentem o impacto”, explica Ana Maria.
Mesmo sem geadas intensas e prolongadas neste ano, a especialista alerta para as oscilações bruscas no clima e reforça que o inverno da região mantém suas características típicas: seco e relativamente frio. “As culturas já estão adaptadas a essa realidade. Mas o crescimento das plantas pode ser afetado. Elas ‘esperam’ condições melhores para se desenvolver. A falta de chuvas também influencia, ainda que neste ano o verão tenha proporcionado algum alívio com precipitações suficientes para garantir certa estabilidade nos reservatórios”, avalia.
Adaptação e manejo no campo
No dia 25 de junho, o Cepagri, em Campinas, marcou 4ºC, o suficiente para gear e afetar algumas produções. Em Jaguariúna, o produtor orgânico Eduardo de Souza cultiva uma variedade de hortaliças, legumes e grãos. Com 20 anos de experiência, ele explica que o inverno é o melhor período do ano, dependendo do tipo de cultura. “De abril até agosto temos excelente qualidade em folhas como alface, couve, repolho, brócolis e couve-flor. São plantas de inverno. Já a abobrinha, o milho e o feijão, que são de verão, sofrem muito. Chegam a queimar com o frio e, no caso da abobrinha, a planta morre”, relata.
Eduardo já enfrentou geadas mais severas em 2021 e afirma que este foi o inverno mais rigoroso desde então. Em sua propriedade, culturas como inhame, milho verde e mandioca foram diretamente afetadas. Ele ainda testou técnicas para amenizar os danos. “Na primeira geada joguei água pela manhã para tentar salvar as plantas. Na segunda não joguei, e foi até melhor. Perdi menos. Mas, mesmo com a recuperação, as folhas ficam manchadas e a qualidade da produção cai”, explica.
A tecnologia como aliada
A pesquisadora Ana Maria destaca que, além da irrigação e do controle de poda — que ajudam a manter o calendário de colheitas —, os agricultores precisam ajustar o manejo conforme o ciclo natural das estações. A informação meteorológica precisa e o planejamento são fundamentais. “Não tem como fugir completamente das perdas, mas é possível adaptar. O uso correto de irrigação, a escolha do momento da poda e a seleção de cultivares mais resistentes são estratégias que vêm sendo usadas com sucesso”, aponta.
Mudanças climáticas já são realidade no campo
As alterações no padrão climático são evidentes, segundo Ana Maria. Dados do Cepagri mostram que os picos de calor se tornaram mais frequentes e intensos, enquanto os dias frios extremos, como os que provocam geada, têm se tornado menos comuns — embora ainda aconteçam. “A tendência nos últimos 30 anos é de um leve declínio no volume total anual de chuvas e maior concentração delas no verão. Ao mesmo tempo, as ondas de calor aumentaram. Isso exige mudanças nas práticas agrícolas e monitoramento constante”, alerta.
Previsão para os próximos meses
Para o restante de 2025, o cenário é de normalidade climática. Sem a influência de fenômenos como El Niño ou La Niña, o inverno tende a seguir o padrão tradicional da região: noites frias, pouca chuva e dias ensolarados, diferente do que tem se observado nos últimos anos, devido a presença dos fenômenos. A primavera pode marcar o retorno de chuvas mais regulares.