É SOBRE SENTIR

“Como posso simplesmente não sofrer se a pessoa que eu amo fez as malas e foi embora”, me perguntou o rapaz de 39 anos ao chegar na primeira sessão de terapia. Assim como ele, me deparo com tanta gente que questiona sobre como deixar de sofrer! Algumas pessoas passam por uma tristeza tão grande, que não conseguem sequer expressar em palavras, mas me suplicam no olhar, por uma resposta quase que milagrosa. Como por exemplo a menina de 21 anos que me pediu uma fórmula mágica para sanar a dor de um luto por ter perdido a mãe e o irmão num espaço de seis meses.

Sofremos por muitos motivos e sinto dizer que não dá pra “não sentir”. Como o título desse texto já sugere, é sobre sentir. Sentir tudo. O que almejávamos e não aconteceu ou o que aconteceu, mas que nos trouxe junto o arrependimento. A questão é que a maioria de nós, quando se depara com sentimentos ruins, não sabe o que fazer com eles.

Não somente pelos estudos que tenho e pela experiência nos atendimentos, mas principalmente pelo fato de também ser humana e sentir as mesmas dores que qualquer um, costumo dizer aos meus clientes o seguinte: “Sinta. Só sinta”. É isso mesmo. Não tem por onde fugir. Se aposse do que você tem. É dor de solidão, de perda, de arrependimento? Então sinta. É alegria, força, coragem? Sinta também. Não existe a alternativa do “não sentir”.

Como alguém que perde um ente querido vai fazer de conta que não está sofrendo? Se, durante um luto, por exemplo, alguém te disser: “eu estou ótima, tá tudo bem”, você pode ter certeza de que não está. Há algo disfuncional com quem se recusa a sentir o que, naturalmente, causa dor. Podemos fazer uma analogia em relação às crianças, que são sinceras, verdadeiras e não costumam esconder suas emoções. Se você disser a elas que a injeção não vai doer nada, obviamente, quando essas crianças sentirem a picada da agulha, vão saber que doeu e ainda vão te considerar um mentiroso. Já se você disser que vai doer um pouquinho, mas que será só momentâneo e necessário passar por isso, elas vão sentir, podem até chorar, mas entenderão que as coisas são como têm que ser. Assim são os acontecimentos na vida da gente, que muitas vezes fogem do nosso controle. Não existe a possibilidade de “descer pro play” sem a chance de se machucar num brinquedo. Também não existe essa conversa de viver sem estar sujeito a sentir tanto alegrias, quanto tristezas.

É sobre sentir mais e parar de perder tempo tentando achar explicações pra tudo. É se permitir amar e chorar; Se arriscar e se arrepender; Planejar e se frustrar; Traçar metas e talvez ter que refazer a rota no meio do caminho; É sobre descobrir que não precisamos ser fortes o tempo; Que não precisamos ter todas as respostas e que não estamos no controle de nada nem de ninguém; É sobre olhar pra dentro de nós e entender que o “sentir” nos faz crescer e amadurecer. Porém, existe uma diferença enorme entre se permitir sentir a dor que algo está lhe causando ou mergulhar num sofrimento sem fim. Até mesmo o luto tem suas fases (negação, raiva, barganha, depressão e aceitação) como um processo que, psicologicamente, é necessário para que a pessoa consiga vivenciar essa experiência dolorosa e reencontre novamente a vontade de sorrir.

Entenda que enfrentar um momento doloroso não vai te fazer esquecer dele. Um divórcio normalmente deixa marcas. Confiar em alguém e ser enganado, nos traz decepção. Uma demissão nem sempre é desejada e causa desilusões. Um fracasso financeiro traz frustrações. Enfim, o sentimento vai passar, mas vão ficar as memórias desse tempo vivido. Isso é ruim? Não necessariamente. Isso é necessário e pode ser bom quando sabemos reagir a tudo isso. Quando nos livramos da dor que um acontecimento nos causou e sobra apenas a lembrança desse acontecimento, nos permitimos tirar lições valiosas desse momento da nossa vida.

Antes de trabalhar com reprocessamento do inconsciente, se me dissessem que seria possível deixar de sofrer a dor de um abuso, por exemplo, eu duvidaria. Hoje sei que isso é perfeitamente possível. A pessoa esquece desse abuso? Não. Mas isso deixa de ser um trauma e passa a ser uma memória – ruim – mas só isso. Algo que fez parte da sua história e só. Vida que segue.

Portanto, seja qual for o motivo do seu sofrimento, olhe pra ele de frente. Convide-o para tomar um café e converse com ele. Não fuja dele porque ele te perseguirá pra sempre. Se permita chorar (muito se for preciso), mas não permaneça no choro. Lave seu rosto, levante a cabeça e siga em frente, dando um passo de cada vez, como você sempre fez. Retome, recomece quantas vezes for preciso, mas não pare, não desista. Abra a janela e veja a obra que Deus fez. Foque no que é bom porque, sim, existem coisas boas. Não dê espaço na sua mente para que as dúvidas, os ressentimentos e as tristezas se acomodem e façam morada. Entenda esses sentimentos como visitas passageiras, que vêm para lhe trazer uma mensagem, mas que devem partir.

Caso você leitor (a), esteja lutando contra um sentimento que persiste e está te tirando o brilho, não deixe de procurar ajuda. Lembre-se: Você não precisa enfrentar tudo sozinho e o processo terapêutico pode te ajudar muito nesses momentos.

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