A LIBERDADE RELIGIOSA E AS CELEBRAÇÕES DE NATAL EM ESPAÇOS PÚBLICOS

A liberdade religiosa é um dos pilares fundamentais das democracias contemporâneas e encontra respaldo tanto em documentos internacionais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, quanto em legislações nacionais, como a Constituição Federal brasileira. Esse princípio assegura o direito de professar, manifestar, praticar e disseminar crenças religiosas, assim como o direito de não aderir a nenhuma religião. Entretanto, sua aplicação em contextos práticos, como as celebrações de Natal em espaços públicos, frequentemente suscita debates jurídicos e sociais.

No Brasil, o Natal, embora tenha uma origem essencialmente cristã, se consolidou como uma tradição cultural e um feriado nacional. Decorações natalinas, como árvores, presépios e iluminações, são frequentemente vistas em praças, repartições públicas e outros locais de uso coletivo. Essa prática, entretanto, levanta questionamentos quanto à laicidade do Estado, princípio consagrado no artigo 19 da Constituição Federal, que veda à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer ou subvencionar cultos religiosos.

O primeiro ponto a ser destacado é que a exibição de símbolos natalinos em espaços públicos não configura, por si só, violação à laicidade do Estado. A jurisprudência brasileira tende a considerar essas práticas como expressões culturais que transcendem o âmbito estritamente religioso. O Supremo Tribunal Federal (STF) tem reafirmado que o Estado laico não é sinônimo de Estado antirreligioso, mas sim de neutralidade e pluralismo. Portanto, manifestações que reflitam tradições culturais amplamente compartilhadas pela sociedade, desde que não imponham determinada crença ou discriminem outros grupos, são compatíveis com a laicidade.

Contudo, a implementação dessas celebrações deve observar alguns parâmetros para garantir o respeito à diversidade religiosa. Em primeiro lugar, a utilização de recursos públicos para promover tais eventos deve ser justificada como um interesse público, com ênfase no caráter cultural e inclusivo das manifestações. Além disso, é essencial assegurar que outros grupos religiosos tenham igual oportunidade de expressar suas tradições, caso queiram, em espaços semelhantes.

Outro aspecto relevante é a necessidade de preservar a liberdade de consciência de indivíduos que não se identifiquem com a tradição cristã ou que optem por não celebrar o Natal. Isso significa que participações em eventos de caráter religioso ou cultural devem ser voluntárias, tanto no ambiente escolar quanto em órgãos públicos.

Por fim, o desafio reside em equilibrar a celebração de tradições amplamente difundidas com o respeito à pluralidade que caracteriza a sociedade brasileira. Cabe ao jurista, ao gestor público e à sociedade como um todo promover um diálogo que concilie liberdade religiosa, laicidade e inclusão, assegurando que os espaços públicos sejam verdadeiramente democráticos e representativos.

Em suma, as celebrações de Natal em espaços públicos devem ser vistas sob a perspectiva de um Estado laico que respeita e promove a diversidade. A chave para evitar conflitos está no tratamento equitativo de todas as manifestações culturais e religiosas, garantindo que nenhuma crença seja privilegiada em detrimento de outras. Assim, o Natal pode continuar sendo uma celebração inclusiva, que une os brasileiros em torno de valores como solidariedade e paz.

Dr. Caius Godoy, Advogado e Presidente da Comissão de Agronegócios e Assuntos Agrários da OAB Jaguariúna, Direito de Família e Sucessões e Direito Religioso.
e-mail: caius.godoy@adv.oabsp.org.br