OAB SP promove formação antirracista para dirigentes da entidade

Secional investe em formação em letramento racial para as Comissões da Secional e das Subseções 

A OAB SP realizou no último sábado, 7, uma formação em letramento racial para os presidentes das Comissões da Secional e das Subseções, com o objetivo de promover a  erradicação do racismo na instituição, por meio da educação. O curso antirracista estabelece um novo paradigma dentro da entidade, uma vez que as políticas de combate à desigualdade racial, incluindo as temáticas de inclusão e diversidade, são um eixo norteador e transversal da gestão, que estão sendo aplicados em todas as esferas da Ordem.

De acordo com Irapuã Santana, conselheiro secional e presidente da Comissão Permanente de Igualdade Racial da OAB SP, que participou da construção das políticas antirracista ainda na campanha, os programas de igualdade exigem, antes de mais nada, a compreensão dos processos e contextos de produção da desigualdade racial. “Aprovamos a carta compromisso na primeira sessão do Conselho Pleno, por unanimidade, e com grande comoção. O passo seguinte foi organizar uma forma de conscientização, para que o compromisso não ficasse apenas em palavras.  Já colocamos a cota racial como critério para a formação da lista sêxtupla do Quinto Constitucional. Agora, todas as comissões vão ter um olhar antirracista, de inclusão e de acolhimento dos membros da advocacia negra paulista”.

A presidente Patricia Vanzolini abriu o evento destacando a relevância do tema e de como as leis no país demoraram para cessar o longo processo de desumanização que a população negra enfrentou, e ainda enfrenta, e como a educação tem papel fundamental na transformação da sociedade. “A primeira lei antidiscriminação que tivemos é de 1951, a Lei Afonso Arinos, que tipificava como contravenção penal a discriminação de raça ou cor. Só em 1988, com a Constituição Federal, é que o racismo se tornou crime, inafiançável, imprescritível e punido com reclusão. Chegamos em 2022, 134 anos depois da abolição, enfrentando a desigualdade racial. Basta olhar para os lugares de poder, para os bancos do ensino jurídico. Precisamos nos engajar num esforço ativo para que o racismo desapareça. Isso passa primeiro pela compreensão, pela percepção do racismo em nós, pela educação e é o que estamos fazendo. Cada um de nós será um agente para viralizar uma ideia, uma ideologia antirracista, que é a nossa missão institucional”.

O curso elaborado por Silvia Souza, conselheira federal e presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB Nacional; por Alessandra Benedito, conselheira federal e presidente da Comissão de Igualdade Racial da CFOAB; e por Irapuã Santana, foi dividido em cinco etapas: sensibilização (por meio de uma dinâmica), e a formação em si, que abordou a evolução histórica, a condição socioeconômica da população negra no Brasil atual, os conceitos de raça, racismo, discriminação, preconceito, e as mudanças necessárias para o fim da desigualdade enfrentada pela advocacia negra.

Silvia explicou que o objetivo do letramento racial é trazer uma reflexão acerca das questões raciais montado de uma forma cronológica e para estimular a advocacia a buscar mais conhecimento sobre o racismo. “Estamos comprometidos com uma gestão antirracista, que é um elemento que integra e organiza nossa sociedade, do ponto de vista político, econômico e social e precisamos lançar mão de ferramentas para poder enfrentá-lo dentro de nossa institucionalidade”.

Alessandra promoveu uma dinâmica, que sensibilizou a plateia, para medir o nível de desigualdade entre brancos e negros e com a conscientização promover a transformação e questionou os presentes sobre o papel de cada um nesse processo de desconstrução. “Como posso contribuir para a mudança? Que a diversidade que existe em você não exclua jamais a diversidade que existe no outro. Combater o racismo estrutural, combater as múltiplas situações de desigualdade social, política e econômica que permeiam o nosso país, passa também pelo despertar de quem somos, como nos constituímos, e como estamos usando nossos recursos de poder para mudar essa sociedade”.

Já Irapuã Santana trouxe o contexto histórico, ressaltando a importância de entender as diferenças da escravização na história mundial, com a desumanização da população negra que ocorreu no Brasil, estabelecendo a linha cronológica, desde 1530 até a assinatura da Lei Áurea, em 1988. “A construção do país foi pautada no conceito de que os negros não eram reconhecidos como seres-humanos. São 134 anos desde a libertação, mas ainda não é possível ver respostas efetivas a partir das instituições”.

A economista Roseli Faria, vice-presidente da Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Planejamento e Orçamento (Assecor), que representa analistas e técnicos da carreira do Poder Executivo Federal, falou sobre a condição socioeconômica da população negra no Brasil e mostrou, a partir de pesquisas e levantamentos, que o Brasil é um dos países mais desiguais do planeta. “É preciso políticas de chegada, de transferência de renda e garantia de trabalho, de igualdade de oportunidades, de saúde e de educação. A sociedade continua a reproduzir desigualdades a partir do racismo estrutural”.

A professora doutora Eunice Prudente, secretária municipal de Justiça do município de São Paulo, destacou a importância da atuação política na luta de combate ao racismo. “A compreensão da desigualdade racial deveria estar na pauta política dos governos. É o que essa gestão está fazendo: colocou esse tema como prioridade nas providências que estão sendo tomadas, a começar por um letramento racial. Os cidadãos precisam cobrar mais por posicionamentos políticos”, enfatizou.

Por fim, Hédio Silva Junior, mestre e doutor em em Direito pela PUC-SP, conselheiro federal da OAB por três gestões, enalteceu a iniciativa, ao afirmar que o letramento racial é pleno de significado, e que a Secional tem potencial para fazer uma “revolução na sociedade sobre o tema”. Ele ainda trouxe à luz a discussão sobre o ensino jurídico, que está pautado por valores dos anos 1940. “A Ordem tem que ter um papel fundamental na aprovação do conteúdo do ensino jurídico. O que está sendo aplicado hoje, descortina um potencial extraordinário para impactar com esses valores outros setores. Que a OAB recupere o protagonismo, a atuação proativa e não apenas corporativa. Nossa causa é a defesa da dignidade da pessoa humana, da democracia, da cidadania. Nunca seremos uma democracia enquanto o Estado não garantir que essa diversidade possa se expressar publicamente num ambiente de coexistência, de respeito recíproco, de convivência harmoniosa, de cultura de paz”, finalizou.

 

 

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