Ética e segurança do paciente são a base da prescrição médica
Foto: Freepik
Pesquisa revela lacuna de informações em remédios isentos de prescrição
Recentes estudos sobre a segurança de medicamentos têm levantado o debate sobre a importância de uma prescrição mais informada e responsável. Um exemplo disso é a pesquisa realizada pela Universidade de Brasília (UnB), publicada no periódico “Saúde em Debate”, que revelou lacunas no uso de remédios isentos de prescrição.
Dos 188 medicamentos analisados, em 376 apresentações, 39% apresentaram evidência científica baixa, muito baixa ou ausente, o que significa que podem ter sido baseados em estudos com amostras pequenas ou falhas metodológicas. Além disso, 95% não fornecem informações claras sobre o uso por gestantes, e 67% são considerados inadequados para crianças menores de seis anos.
Segundo a pesquisadora da UnB, Nara Laismann, muitas dessas substâncias são administradas em crianças com base em adaptações feitas a partir de estudos realizados exclusivamente em adultos, como o ajuste de doses de acordo com o peso, o que levanta questões éticas relacionadas à segurança.
Entre os medicamentos populares de uso comum, o paracetamol chamou atenção dos pesquisadores pelo uso indiscriminado, frequentemente sem orientação médica. Laismann indica que a prática pode causar riscos de toxicidade ao paciente, levando à insuficiência hepática e à morte.
A automedicação é uma prática comum, mas perigosa, pois pode mascarar doenças, provocar interações medicamentosas e comprometer o diagnóstico correto. Nesse cenário, a prescrição médica vai além de uma simples recomendação de tratamento: ela reflete a responsabilidade ética do médico, que, a partir de uma avaliação clínica criteriosa, determina o caminho terapêutico mais adequado.
Tipos de receita variam de acordo com o medicamento
De acordo com o Manual de orientações básicas para prescrição médica, produzido pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) e pelo Conselho Regional de Medicina do Estado da Paraíba (CRM-PB), existem diversos modelos de receita médica, que variam de acordo com a substância prescrita.
Entre elas estão a receita simples, para medicamentos de tarja vermelha que não exigem retenção, a de controle especial, para os que necessitam retenção – como imunossupressores e antidepressivos -, a receita azul (ou receita B), para medicamentos que contenham substâncias psicotrópicas, e a receita amarela, para substâncias entorpecentes ou psicotrópicas.
Produtos à base de canabidiol, por exemplo, podem exigir diferentes receitas, dependendo da substância controlada. De acordo com o Conselho Regional de Farmácia do Rio Grande do Sul (CRF/RS), o canabidiol obtido sinteticamente exige receita de controle especial em duas vias.
Já os produtos de Cannabis que contém Tetrahidrocanabinol (THC) em concentração de até 0,2% requerem Notificação de Receita B (NRB), enquanto aqueles com THC acima desse valor requerem Notificação de Receita A (NRA).
Outro exemplo são os medicamentos à base de semaglutida, como Ozempic e Wegovy. Utilizados para diabetes tipo 2 e obesidade, apresentam tarja vermelha, mas não exigem retenção da receita pelo farmacêutico.
Recentemente, a Anvisa iniciou discussões para exigir a retenção de receita na farmácia, buscando conter o uso indiscriminado. A venda sem retenção tem facilitado o uso inadequado, impulsionado por tendências das redes sociais, o que pode acarretar efeitos colaterais graves, como náuseas, hipoglicemia e complicações metabólicas.
Autoridades de saúde, como a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem) e a Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso), desaconselham práticas como usar Wegovy e Ozempic sem acompanhamento médico e indicam que a venda sem retenção reduz a disponibilidades para aqueles que realmente necessitam do tratamento.
A prescrição médica no Brasil segue regras detalhadas, regulamentadas por leis, como a 5.991/73 e a Resolução 357/01 do Conselho Federal de Farmácia (CFF). As receitas devem ser claras, datadas, assinadas e conter o número do registro profissional do médico, evitando qualquer dúvida quanto à autenticidade.
A realização de diagnósticos e a prescrição de medicamentos são atribuições exclusivas de médicos, cirurgiões-dentistas e veterinários, sendo cada profissional limitado às áreas específicas de sua especialidade.
Prescrição exige compromisso ético
O Conselho Federal de Medicina (CFM) destaca que a prescrição médica exige do profissional um compromisso ético. É imprescindível que o médico esclareça ao paciente o diagnóstico, os riscos e os objetivos do tratamento, conforme previsto no Código de Ética Médica.
A falta de clareza ou negligência nesse processo pode comprometer a saúde do paciente e a credibilidade profissional. Além disso, o CFM e os Conselhos Regionais de Medicina reforçam que a prescrição deve ser personalizada, considerando as condições específicas de cada pessoa.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) também recomenda etapas básicas para uma prescrição eficiente, incluindo a definição do problema, a seleção do tratamento mais seguro, a especificação dos objetivos terapêuticos e o monitoramento do tratamento proposto.